Ling Apresenta: Talita Hoffmann
21/11/2022 às 10h30 até 28/01/2023 às 20h
O Instituto Ling recebeu a artista visual porto-alegrense Talita Hoffmann para uma intervenção artística em uma das paredes do centro cultural. De 21 a 25 de novembro de 2022 o público pôde acompanhar gratuitamente a criação ao vivo da nova obra, observando as escolhas, os gestos e os movimentos da artista. Após a finalização do trabalho, o artista comentou a experiência e o resultado em bate-papo com o público e a curadora.
A exposição ficou em cartaz até 28 de janeiro de 2023.
Ling Apresenta: Ver o mundo outra vez
Apresentar: mostrar; expor; tornar público; oferecer (alguma coisa) a (alguém); pôr diante ou na presença; dar a conhecer. Ling Apresenta: Ver o mundo outra vez é a primeira edição de um novo projeto, como pede o novo tempo – esse, que é essencialmente o mesmo, mas não pode ser, pois passamos por muito.
A ideia central é trazer ao Instituto Ling novos – ou outros – nomes da arte contemporânea. Não são descobertas, porque eles já estão no mundo, trabalhando, cada um a seu modo, buscando a inserção em um sistema complexo de legitimação. Uma busca que, cabe dizer, é incessante. Uma exposição não legitima um artista, mas joga luz sobre a sua obra e permite aquilo que há de mais importante quando se produz: dialogar com o público.
Compartilhar um nome, um trabalho e o fazer artístico é o que forma o cerne desse projeto. O convite é para que os artistas façam uma intervenção diretamente em uma das paredes do Instituto. Uma parede que conduz o visitante até o fundo do espaço, que é contemplada por quem se senta no café, e é vista da rua pelos passantes. Durante uma semana, o público será convidado a acompanhar a produção dessa parede-obra. Enquanto o artista trabalha, o público observa: escolhas são feitas, gestos e movimentos acontecem, materiais se sobrepõem, uma obra vai tomando forma.
Ao longo de 2022, serão apresentados quatro artistas, em diferentes momentos de suas carreiras, com distintas produções e temáticas. O que os conecta é justamente uma não-conexão, ou melhor, a conexão mais geral que poderia haver: são artistas, trabalham com afinco, produzem em diferentes meios, levantam questões contemporâneas, provocam reflexões e nos fazem olhar sempre e de novo – mas não para o mesmo.
Luísa Kiefer
Início do outono, 2022
Talita Hoffmann
por Luísa Kiefer
Primavera, 2022
Arrisco dizer que muito daquilo que nos cerca hoje, seja no âmbito dos espaços físicos – essa coisa um pouco padronizada, modelada conforme o gosto do tempo, os objetos, a decoração –, seja nas questões mais subjetivas – excesso de estímulos, de mensagens, de imagens e de referências –, está presente na pintura de Talita Hoffmann. Fosse apenas isso, suas pinturas seriam uma sobreposição desordenada. Mas, não são. Talita tem um filtro, que é aquilo que a faz ser artista, e tem humor. Ela tem uma certeza, por certo subjetiva, mas é o que a permite trabalhar com segurança. É difícil de colocar em palavras, mas está lá, fazendo o seu papel a cada imagem que a artista observa e resolve tornar pintura.
Para a construção da parede que faz parte do projeto Ling Apresenta, Talita, que geralmente parte de um banco de imagens que ela coleciona, resolveu trabalhar de forma diferente. Convidou o público a colaborar enviando fotografias feitas nas dependências do Instituto Ling. Poderia ser qualquer imagem: um detalhe, uma parede, um canto escondido, um revestimento, um plano aberto, enfim qualquer foto que revelasse um pedaço do próprio lugar. A pintura seria construída, então, a partir dessas imagens.
Com a parede em branco, começam as escolhas. As fotografias são transferidas por um processo muito simples. Projetor ligado, imagem projetada, Talita vai riscando com um lápis, escolhendo as partes que quer mostrar. Aí está um ponto de atenção: não é porque recebeu a fotografia, que ela precisa ser usada. Ela seleciona aquilo que a interessa enquanto artista, que faz sentido dentro da composição que ela deseja criar. Há, o tempo inteiro, um pensamento pictórico e compositivo que se impõe, que direciona as escolhas e determina o que entra e como entra na parede. Assim, uma forma pode ser subitamente interrompida. Uma linha que descia reta, desenhando uma janela, de repente se transforma em pequenas ilhas.
Das linhas de lápis, Talita passa para a tinta. Tudo começa pelo fundo. Grandes campos de cor que preenchem perspectivas, que levam o olhar e constroem a primeira camada da pintura. São áreas bem delimitadas, com formas específicas, que dialogam com as imagens que virão por cima. Conforme a pintura avança e a parede se completa, vários ângulos, arestas, objetos, mobiliário e elementos arquitetônicos vão tomando conta do espaço. De uma forma, o olho salta para a seguinte. A artista encaixa uma quina de parede com o início de um corrimão, o fim de um teto com o começo de um chão.
Essa camada, mais gráfica, de desenhos feitos com linhas, sobre as manchas de cor do fundo, comunica também sobre a trajetória de Talita enquanto designer gráfica e ilustradora. É, para mim, precisamente aqui que o humor característico das outras obras da artista aparece: na escolha desses detalhes, dos objetos e em suas sobreposições e relações. Há, em toda a sua composição, diversos caminhos para o observador percorrer.
As imagens recebidas, que não tinham uma delimitação temporal – poderiam ser de qualquer época –, compõem, sem querer, uma espécie de histórico do Instituto Ling. É possível identificarmos obras de arte que já passaram pela galeria e outras que por lá vivem, como parte do acervo permanente. Em um canto, o olho atento encontrará uma meta-obra, um canto da parede fotografado e enviado para a artista, e que de imagem da obra voltou a ser obra.
Em um primeiro momento, relacionei tudo isso a uma ideia de labirinto. Aos poucos, fui me dando conta que a poética de Talita fala, para mim, muito sobre o nosso jeito de viver. Pulando de uma coisa para outra, de um ambiente para outro, sobrepondo conversas e assuntos, passando de uma janela para outra no computador, colecionando abas e referências, imagens – físicas, virtuais e imaginadas –, tudo permeado pela velocidade acelerada do cotidiano.
Porém, a pintura de Talita não é acelerada. Pelo contrário, ela desacelera o tempo com suas composições. Requisita a nossa atenção, encurrala o olhar em um acúmulo de formas. Só parando diante da obra podemos esmiuçar aquilo que forma o todo. Eu encontrei um pouco de mim mesma, talvez o espectador encontre outras coisas.
Sobre a curadora:
Luísa Kiefer (Porto Alegre/RS, 1986)
Jornalista, pesquisadora e curadora independente. É doutora em História, Teoria e Crítica de Arte pelo Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais do Instituto de Artes da UFRGS. Em 2017, foi pesquisadora visitante no departamento de fotografia do Centre for Research and Education in Art and Media (CREAM) da University of Westminster, Londres, Inglaterra. É Mestre em História, Teoria e Crítica de Arte pelo mesmo programa e jornalista formada pela PUCRS. Nos últimos anos, realizou a curadoria de exposições, individuais e coletivas, em diferentes espaços como Fundação Ecarta, Goethe-Institut Porto Alegre, Instituto Ling, Espaço Cultural ESPM-Sul e Fundação Vera Chaves Barcellos. Desde 2018, coordena, junto com Eduardo Veras, o projeto de catalogação da obra da artista plástica Gisela Waetge. Em 2019, foi curadora geral do Linha, espaço independente de artes visuais, em Porto Alegre. Em 2021, recebeu o XIV Prêmio Açorianos de Artes Plásticas na categoria Jovem Curadora/Aliança Francesa.
O Ling Apresenta tem realização do Instituto Ling e Ministério do Turismo / Governo Federal, com patrocínio de Crown Embalagens e Fitesa.
ficha técnica da exposição
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Artista
Talita Hoffmann
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Curador
Luísa Kiefer
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Identidade Visual
Adriana Tazima
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Produção Executiva
Laura Cogo
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Programa Educativo
Camila Salvá